Em meados dos anos 90, a Monsanto percebeu algo que a maioria das empresas do agro ainda levaria anos — ou décadas — para compreender: a inovação biotecnológica só gera valor real se vier acompanhada de controle sobre o germoplasma.
Naquele momento, a empresa apostava suas fichas na tecnologia Roundup Ready. Seu modelo de negócio era baseado no licenciamento do gene para grandes empresas de sementes, como a Pioneer. A Pioneer aceitou o licenciamento — mas o valor pago foi muito inferior ao que a Monsanto esperava. Foi aí que caiu a ficha: quem detém apenas a biotecnologia, mas não controla a semente, fica à margem do valor que chega ao agricultor.
Esse episódio foi o gatilho para uma mudança radical de estratégia. A Monsanto decidiu verticalizar. Comprou a Holden’s Foundation Seeds em 1997, garantindo acesso a germoplasmas amplamente utilizados pela indústria. Em 1998, adquiriu a Dekalb Genetics. Em 2005, comprou a Seminis, entrando no mercado de hortaliças. A Monsanto não estava apenas expandindo portfólio — estava estruturando uma plataforma completa, onde biotecnologia, genética e distribuição estariam sob a mesma governança estratégica.
Enquanto isso, outras gigantes do setor, como Syngenta, BASF e DuPont (que mais tarde originaria a Corteva), só entrariam de forma relevante no mercado de sementes e transgênicos entre meados dos anos 2000 e 2010. A maioria dessas empresas se apoiava em uma narrativa muito comum à época: a da “solução integrada”. A proposta era combinar sementes, biotecnologia e defensivos em um pacote único, com um time comercial unificado e promessas de sinergias operacionais.
Na teoria, parecia brilhante. Mas, no campo, a história foi diferente.
A Monsanto entendeu antes de todos que sementes e defensivos são negócios completamente distintos — em lógica técnica, em modelo comercial e em tempo de execução.
Vender sementes exige profundo conhecimento agronômico, domínio da fisiologia vegetal, capacidade de fazer posicionamento técnico por região e uma atuação consultiva com o produtor. Requer presença constante em campo, condução de áreas demonstrativas e planejamento pré-safra. O agricultor vê a semente como um potencializador de produtividade — e quer provas disso antes de decidir.
Defensivos, por outro lado, seguem uma lógica de volume, estoque, metas e campanhas sazonais. Grande parte da rotina comercial está nas negociações com distribuidores e cooperativas, gestão de incentivos e controle de giro no canal. O valor está em proteger o potencial da lavoura, não em ampliá-lo.
O problema: várias empresas quiseram unir essas duas rotinas sob o mesmo vendedor, no mesmo calendário, com a mesma meta. Mas no campo, não dá para fazer tudo ao mesmo tempo. O resultado foi foco diluído, desempenho abaixo do esperado e frustração com a prometida “sinergia”.
A Monsanto evitou esse erro. Criou equipes dedicadas, com estruturas específicas para sementes e defensivos. Manteve foco técnico. E ainda desenhou um modelo de licenciamento que lhe deu escala e penetração no mercado sem sacrificar a qualidade da execução.
Esse talvez seja o maior legado da empresa: a clareza de que integração só funciona quando estrutura, estratégia e execução estão em harmonia com a realidade do negócio.
O que isso nos ensina hoje?
- Ter um portfólio completo não basta — é preciso respeitar as diferenças entre os modelos de negócio.
- A eficiência organizacional depende de reconhecer que sementes exigem conhecimento, tempo e abordagem completamente diferentes dos defensivos.
- E, por fim, nenhuma sinergia justifica decisões que desconsideram a lógica do campo e o comportamento real do agricultor.