Nos últimos anos, os produtos biológicos têm ganhado espaço no agronegócio brasileiro. No entanto, muitos agricultores se frustram com resultados inconsistentes no campo e se perguntam: quando o desempenho é abaixo do esperado, será que basta aumentar a dose? A resposta exige uma análise mais profunda, principalmente sobre a concentração de microrganismos vivos, medida em Unidades Formadoras de Colônias (CFU/mL ou CFU/g).
A importância da concentração (CFU)
A eficácia de um produto microbiológico está diretamente relacionada à quantidade de microrganismos viáveis na formulação. Essa concentração, expressa em CFU, varia de acordo com o tipo de microrganismo:
- Bactérias gram-negativas não esporuladas (ex: Azospirillum, Pseudomonas): geralmente apresentam concentrações mais baixas, ao redor de 1 × 10⁴ CFU/mL.
- Fungos e bactérias esporuladas (ex: Bacillus, Trichoderma, Beauveria): alcançam concentrações muito maiores, frequentemente acima de 1 × 10⁹ CFU/mL.
Essa diferença é natural: esporos são estruturas resistentes, capazes de manter a viabilidade por mais tempo, mesmo sob condições ambientais adversas. Já as bactérias não esporuladas são mais sensíveis e exigem maior cuidado na formulação e aplicação.
Concentração x Dose x Estabilidade
A concentração do produto microbiológico impacta diretamente dois fatores críticos:
- Dose recomendada no campo (mL/ha ou g/ha): Em geral, produtos mais concentrados requerem menores volumes para atingir a carga microbiana desejada por hectare.
- Estabilidade Pós-Aplicação: A viabilidade dos microrganismos pode diminuir com o tempo e com a exposição a fatores como temperatura, umidade e radiação UV. A concentração inicial maior serve para compensar essas perdas naturais.
Estudos indicam que a concentração de 1 × 10⁴ a 1 × 10⁵ CFU por grama de solo ou por semente é suficiente para gerar benefícios agronômicos significativos. No entanto, para alcançar esse nível no campo, é necessário considerar o que se perde no caminho.
Perdas inevitáveis no ambiente
Ao ser aplicado na semente ou no solo, o microrganismo enfrenta um ambiente hostil: oscilações térmicas, competição microbiana, radiação solar, pH adverso, entre outros. Essas condições podem causar drásticas reduções na viabilidade, especialmente nos primeiros dias após a aplicação.
Para compensar essa perda, as empresas formulam os produtos com concentrações muito superiores àquelas efetivas, assumindo que parte significativa dos microrganismos não chegará viva ao seu destino.
E se o produto for de baixa qualidade?
Quando a concentração de microrganismos viáveis já é baixa na formulação — por falhas no processo de produção, armazenamento inadequado ou vencimento da validade — surge a tentação de aumentar a dose para compensar.
Em teoria, isso é possível. Mas, na prática, é inviável.
A relação entre dose e concentração segue uma lógica logarítmica:
Para cada log (fator 10) de perda na concentração, seria necessário multiplicar a dose por 10 vezes para manter a mesma carga microbiana por hectare.
Por exemplo:
- Produto com concentração ideal de 1 × 10⁹ CFU/mL aplicado a 1 L/ha entrega 1 × 10¹² CFU/ha.
- Se a concentração cair para 1 × 10⁸ CFU/mL, a dose precisaria ser 10 L/ha para atingir o mesmo resultado.
Mesmo que o produto tenha baixo custo como é o caso dos produtos fabricados “on-farm”, esse aumento de dose é economicamente inviável, além de operacionalmente complicado.
Uma reflexão para o agricultor
Aumentar a dose de um biológico de baixa qualidade pode parecer uma solução lógica, mas na prática, é apenas um desperdício de tempo e dinheiro. A verdadeira solução está no uso de produto de boa qualidade e na dose recomendada pelo fabricante.